Livro de Jonas

Imagem: Fonte criada pelo autor

“¹ E veio a palavra do SENHOR a Jonas, filho de Amitai, dizendo: ² Levanta-te, vai à grande cidade de Nínive, e clama contra ela, porque a sua malícia subiu até à minha presença. ³ Porém, Jonas se levantou para fugir da presença do Senhor para Társis. E descendo a Jope, achou um navio que ia para Társis; pagou, pois, a sua passagem, e desceu para dentro dele, para ir com eles para Társis, para longe da presença do Senhor.
Jonas 1:1-3

1. Introdução

Com a prática da justiça, corremos o risco de nos considerarmos superiores aos outros. Por termos conhecido a Verdade do Evangelho, podemos facilmente nos julgar merecedores da salvação e mais dignos do que aqueles que não conhecem a Cristo. A história de Jonas revela um cenário em que um homem chamado por Deus conhecia o povo da Assíria e sua cidade, Nínive, e o quão corrompida ela estava. A maldade era quase incomparável e Deus envia o profeta para pregar contra ela. Contudo, durante a narrativa, ocorre uma inversão: os ninivitas se arrependem e, contraditoriamente, ao invés de se alegrar, o profeta fica indignado, pois não conseguia conceber o perdão de Deus para aquele povo.

2. A Assíria

A cidade de Nínive era uma cidade Assíria; o império Assírio era cruel e perseguia com voracidade. A Bíblia nos dá uma prévia do viria a ser a invasão de Israel ocorrida no ano 722 aC. Veja:

"²⁷ Não haverá entre eles [assírios] cansado, nem quem tropece; ninguém tosquenejará nem dormirá; não se lhe desatará o cinto dos seus lombos, nem se lhe quebrará a correia dos seus sapatos. ²⁸ As suas flechas serão agudas, e todos os seus arcos retesados; os cascos dos seus cavalos são reputados como pederneiras, e as rodas dos seus carros como redemoinho.²⁹ O seu rugido será como o do leão; rugirão como filhos de leão; sim, rugirão e arrebatarão a presa, e a levarão, e não haverá quem a livre.³⁰ E bramarão contra eles naquele dia, como o bramido do mar; então olharão para a terra, e eis que só verão trevas e ânsia, e a luz se escurecerá nos céus." (Isaías 5:27-30)

A maldade do povo era tão grande, que as Escrituras dizem que ela chegou até a Deus (Jn 1:2) e por causa disso o profeta Jonas foi convocado por Deus para profetizar contra ela, pois a intenção de Deus era destruí-la.

Mas mesmo sendo tão forte, o império Assírio foi assolado por um momento de tensão. Nessa época do rei de Israel era Jeroboão II (século 8 a.C). O reino Urartu que ficava ao norte da Assíria era ameaçador para o povo e para seu rei, em decorrência disso, o povo de Israel (agora, reino do norte) teve um período de tranquilidade da Assíria, já que seus olhos estavam focados na ameaça.

Jonas

Jonas era um profeta de Israel (reino do norte), mas em seu livro ele aparece como um mensageiro para levar uma mensagem de destruição. Seu papel foi preocupante, mas, além do provável medo da reação dos assírios, havia um receio de que Deus os perdoasse. Podemos ver que este receio realmente existia, como vemos no capítulo 4:

“mas isso desagradou grandemente Jonas e ele ficou irado… por isso me preveni indo para Társis, pois sabia que és um Deus compassivo e misericordioso, longânimo e grande em benignidade e que te arrependes do mal” (Jonas 4:1-2)

Ao continuar lendo o capítulo 4, vamos ver que Jonas é exortado por Deus por se compadecer de uma planta e não se compadecer do povo arrependido. Veja o texto:

“E disse o Senhor: Tiveste tu compaixão da aboboreira, na qual não trabalhaste, nem a fizeste crescer, que numa noite nasceu, e numa noite pereceu; E não hei de Eu ter compaixão da grande cidade de Nínive, em que estão mais de cento e vinte mil homens que não sabem discernir entre a sua mão direita e a sua mão esquerda, e muitos animais?” (Jonas 4:10-11)

O que vemos no livro de Jonas

O livro é uma reflexão de como enxergamos a misericórdia de Deus e como nos enxergamos. Cremos que Deus é misericordioso conosco, pois "merecemos" seu perdão, por sermos "bons". Entendemos que o fato de crermos em Jesus e sermos praticantes de uma religião nos faz mais merecedores da Graça de Deus do que outras pessoas. Um equívoco clássico e tentador.

Se analisarmos a indignação de Jonas, não é algo fora da nossa realidade, pois vivemos esta mesma situação diversas vezes. Jonas viu os assírios causando grande mal a muitos povos e esse mal ameaçou o povo de Israel. O mesmo mal que Jonas viu nos assírios, podemos ver hoje em nossos dias. O ataque a Israel foi adiado devido aos confrontos com o reino de Urartu (conforme visto no primeiro parágrafo), mas, mesmo assim, décadas mais tarde, Israel sofreu nas mãos dos Assírios. Talvez Deus já tivesse revelado a Jonas o que aconteceria, e é por isso que vemos a indignação de Jonas ao saber que um povo tão maléfico poderia ser perdoado naqueles dias.

A negligência do chamado

Se Deus deu a ordem, porque questionar? Às vezes é difícil entender o que é realmente a voz de Deus e nossa voz, mas, quando Deus está enviando, as coisas começam a caminhar. Jonas foi enviado mas não deveria ser uma surpresa pra ele, pois já era profeta, então sabemos que Jonas sabia distiguir exatamente o que estava vindo de Deus. O problema, foi que a ordem o desagradou e por isso resolveu desobedecê-la.

A desobediência ao chamado, não implicou somente em desagradar a Deus, Jonas colocou em risco a vida de várias pessoas, porque quase sofreram um naufrágio devido à presença de Jonas no barco. Isso me faz pensar em nossa responsabilidade com nosso chamado. Quantas pessoas podemos colocar em risco por causa de uma desobediência? Neste grande navio da vida, o naufrágio poderá trazer a morte espiritual o que terminará em condenação eterna que é pior do que a morte.

Quando pensamos sobre saber discernir a voz de Deus, precisamos exercitar isso. Este exercício nada mais é do que buscar um relacionamento profundo com Deus, diariamente. Quando olhamos a vida dos apóstolos após a ressurreição de Cristo, vemos que eles não tinham nenhuma dúvida do que Deus os falava, porque eles tinham esse relacionamento.

A experiência de Pedro

Algo parecido acontece com Pedro. Vamos ver o texto de Atos 10 e 11. Ao ler estes dois capítulos, você vai ver um homem romano cheio de fé em Deus e que o adorava com orações e jejuns e em seu coração havia profunda preocupação com os marginalizados. Deus revela para Pedro “que suas esmolas têm chegado até seu coração”. Mas, Pedro não concebia que um homem gentio, especialmente romano, pudesse receber a Graça de Deus, então, Deus lhe dá uma visão: a visão dos animais impuros. (Atos 10:11-15)

No texto, vemos que Deus mostra vários animais considerados impuros para os judeus e Deus diz: “mata e come”. Pedro, nega imediatamente, justificando-se diz: “nunca comi coisa nenhuma comum e impura”. O que Deus estava mostrando para Pedro é que se alguém é impuro, este mesmo poderá ser purificado por Deus através de Jesus e Sua graça alcançaria este e que Pedro “não deveria tornar impuro, aquele que Deus purificou”. Ou seja, foi necessário Deus explicar para Pedro que qualquer homem pode ser purificado por Ele.

Há um paralelo entre o livro de Jonas e Atos 10-11. Assim como os assírios, os romanos eram um problema para os judeus e que por indignação, devido aos grandes males que os romanos causavam ao povo de Judá, muitos criam que os romanos não deveriam ser perdoados, que deveriam ser cobrados pelos seus males, mas Deus mostra para Pedro que haviam romanos que alcançaram a remissão por sua fé em Deus e Jesus.

Vamos ver no capítulo 11 que não somente Pedro teve essa dúvida, mas, muitos judeus messiânicos e por isso, Pedro após voltar da casa de Cornélio, teve que explicar a visão para vários judeus e depois de explicada, o povo creu nas palavras de Pedro e adoraram a Deus por ter derramado sua Graça também aos gentios.

A obediência que gera preconceito

Como já mencionado de forma simplificada acima, a obediência sem sabedoria pode levar a uma distinção entre as pessoas. O indivíduo que se dedica a Deus se submete a certas disciplinas, às quais aqueles que não têm nenhum relacionamento com Deus muitas vezes até desconhecem. Por exemplo, o homem de Deus pratica a oração, a adoração, o estudo das Escrituras e busca disciplinas exteriores, como a simplicidade, a submissão, o serviço e várias outras disciplinas comuns para os crentes. O perigo surge quando esse indivíduo, ao olhar para si mesmo e começar a se considerar mais santo por praticar tais obras, começa a julgar aqueles que não têm a mesma prática. Isso nos lembra dos fariseus, conforme citado por Jesus em Mateus 23:4, que impunham fardos pesados sobre os outros enquanto eles mesmos não praticavam o que cobravam dos demais. Esse comportamento reflete um princípio narcisista que muitas vezes passa despercebido por muitas pessoas.

No livro Celebração da Disciplina, Richard Foster menciona esse perigo. Vejamos:

"As disciplinas espirituais pretendem fazer-nos bem. Elas têm a intenção de trazer a abundância de Deus para a nossa vida. No entanto, é possível transformá-las em outro conjunto de leis que farão a alma definhar...
Quando se degeneram e viram lei, as disciplinas acabam sendo usadas como instrumento de manipulação e controle. Valemo-nos de ordens explícitas para aprisionar tais pessoas
"
(FOSTER, Richard. Celebration of Discipline, New York, HarperCollins, 1988. p.39)

Assim como Foster alega, ao buscarmos ser obedientes às disciplinas espirituais, podemos cair na tentação de subjugar pessoas como inferiores se elas não forem praticantes como nós, o que nos levaria a um paradoxo, pois o julgamento em si já é uma forma de desobediência. A obediência deve gerar em nós temor a Deus, amor por seus caminhos e amor por nossos irmãos. Uma vez que a obediência se torna objeto de ostentação e manipulação ela não tem nenhum valor.

A obediência é algo imprescindível na vida do cristão; no entanto, devemos ter cuidado para que nossa obediência não se torne um fardo para os outros. Nossa obediência se limita à nossa vida e não à dos outros, pois cada um prestará contas de sua própria vida a Deus. Ao nos tornarmos modelos de obediência, estamos também cometendo idolatria.

A predestinação

A distinção entre aqueles que estão salvos ou não pode ser ainda mais evidente para aqueles que creem na predestinação. Se alguém crê que uma pessoa não pode ser salva, então não haverá motivação para pregar para essa pessoa. Vamos conversar um pouco sobre esse assunto e esclarecer alguns pontos importantes a partir das Escrituras.

A abordagem da predestinação é bastante sensível, pois atinge uma vertente do protestantismo que é bastante forte e discutível. A crença de que algumas pessoas foram escolhidas para serem salvas e outras para a perdição não surgiu do nada. Martim Lutero, em seu livro Nascido Escravo, fala bastante a favor desta teoria, e mais tarde, ela foi amplamente abraçada por João Calvino (por isso, os que creem nessa doutrina são chamados calvinistas). Os crentes na predestinação não admitem que Deus permita ao homem decidir sobre sua própria vida, como escolher servir a Deus ou não. Diante dessa crença, seria impossível os ninivitas se arrependerem (pois já estavam sob sentença de condenação), assim como podemos pensar que será impossível que algumas pessoas se convertam? Se não cremos que uma pessoa possa escolher a salvação, então não há razão para pregar o Evangelho.

Os textos do Apóstolo Paulo são os mais usados pelos calvinistas no tocante à doutrina da predestinação. Paulo fala sobre o termo Eleição diversas vezes. Vamos ver um dos textos mais comuns:

"29 Pois aqueles que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem do seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. 30 Aos que predestinou, também chamou; aos que chamou, também justificou; aos que justificou, também glorificou." (Romanos 8:29-30)

Apesar de a Bíblia conter textos que parecem corroborar a doutrina da predestinação, os relatos no livro de Jonas e em Atos 10 mostram que até mesmo aqueles que aparentemente não foram chamados por Deus para a salvação podem alcançá-la através do arrependimento, uma vez que Deus nos concedeu livre acesso a Ele por meio de Jesus.

Como vimos no livro de Jonas, a mensagem para Nínive era de destruição. Não havia mensagem de salvação, mas ao ver que o povo se arrependeu, Deus "mudou de ideia", denotando que Deus pode e vai mudar seus planos se as circunstâncias forem diferentes. Vemos também essa mudança de ideia quando Deus anuncia para Moisés que vai destruir o povo e Moisés convence a Deus de não o fazer, como vemos no texto de Êxodo:

" 9 Disse mais o Senhor a Moisés: Tenho visto este povo, e eis que é povo aobstinado. 10 Agora, pois, deixa-me, para que o meu furor se acenda contra eles, e os aconsuma, e eu farei de ti uma grande nação. 11 Pórem Moisés suplicou ao Senhor seu Deus, e disse: Ó Senhor, por que se acende o teu furor contra o teu povo, que tu tiraste da terra do Egito com grande poder e com mão forte? 12 Por que hão de falar os egípcios, dizendo: Para mal os tirou, para matá-los nos montes, e para destruí-los da face da terra? Torna-te do furor da tua bira, e arrepende-te desse mal contra o teu povo. 13 Lembra-te de Abraão, de Isaque, e de Israel, os teus servos, aos quais por ti mesmo juraste, e lhes disseste: Multiplicarei a vossa dsemente como as estrelas dos céus, e darei à vossa semente toda esta eterra, de que falei, para que a possuam por herança eternamente. 14 E o Senhor arrependeu-se do mal que dissera que haveria de fazer ao seu povo. " (Êxodo 32:9-14)

Então, quando Paulo fala de Eleição, eu penso exatamente como um processo eleitoral que temos em um sistema de governo. Aquele que é eleito é porque fez algo anterior que agradou seus eleitores, ou seja, àqueles que passaram a confiar no eleito antes de sua eleição.

Então, olhando por este ponto de vista, nós temos sim, uma parte a qual Deus nos delegou responsabilidades, em outras palavras, responsabilidades que Ele mesmo deu ao homem, as quais Ele não vai interferir segundo sua própria vontade. Aqueles que cumprirem corretamente suas responsabilidades, esses serão os Eleitos e serão como Paulo nos fala no texto de Romanos 8 como lemos. Para fundamentar este meu argumento, vou citar a parábola dos Talentos que Jesus mesmo disse.

14 “E também será como um homem que, ao sair de viagem, chamou seus servos e confiou-lhes os seus bens. 15 A um deu cinco talentos, a outro dois, e a outro um; a cada um de acordo com a sua capacidade. Em seguida partiu de viagem. 16 O que havia recebido cinco talentos saiu imediatamente, aplicou-os, e ganhou mais cinco. 17 Também o que tinha dois talentos ganhou mais dois. 18 Mas o que tinha recebido um talento saiu, cavou um buraco no chão e escondeu o dinheiro do seu senhor. 19 Depois de muito tempo o senhor daqueles servos voltou e acertou contas com eles. 20 O que tinha recebido cinco talentos trouxe os outros cinco e disse: O senhor me confiou cinco talentos; veja, eu ganhei mais cinco. 21 O senhor respondeu: Muito bem, servo bom e fiel! Você foi fiel no pouco, eu o porei sobre o muito. Venha e participe da alegria do seu senhor! 22 Veio também o que tinha recebido dois talentos e disse: O senhor me confiou dois talentos; veja, eu ganhei mais dois. 23 O senhor respondeu: Muito bem, servo bom e fiel! Você foi fiel no pouco, eu o porei sobre o muito. Venha e participe da alegria do seu senhor!24 Por fim veio o que tinha recebido um talento e disse: Eu sabia que o senhor é um homem severo, que colhe onde não plantou e junta onde não semeou. 25 Por isso, tive medo, saí e escondi o seu talento no chão. Veja, aqui está o que lhe pertence. 26 O senhor respondeu: Servo mau e negligente! Você sabia que eu colho onde não plantei e junto onde não semeei? 27 Então você devia ter confiado o meu dinheiro aos banqueiros, para que, quando eu voltasse, o recebesse de volta com juros. 28 Tirem o talento dele e entreguem-no ao que tem dez. 29 Pois a quem tem, mais será dado, e terá em grande quantidade. Mas a quem não tem, até o que tem lhe será tirado. 30 E lancem fora o servo inútil, nas trevas, onde haverá choro e ranger de dentes." (Mateus 25:14-30)

Perceba que o Texto, o homem (conota Deus) que delega os talentos aos trabalhadores (conota a humanidade) não diz o que eles deveriam fazer com os talentos, simplesmente ele lhes dá a responsabilidade de cuidar de seus talentos. Dois dos três investem e um enterra. Os dois que fizeram bem, foram eleitos já o terceiro não foi. Perceba a combinação com o texto de Paulo, pois existe a eleição, mas, diferente da teologia da predestinação, aqui o homem tem a responsabilidade que fora divinamente outorgada e ao cumpri-la, é eleito, ao contrário, aqueles que negligenciam suas responsabilidades, não podem ser eleitos. E os eleitos são chamados (parafraseando Paulo) e são glorificados, exatamente como esta parábola nos mostra.

Outra parábola que tem o mesmo contexto é a parábola das dez virgens (Mt 25:1-13). Elas tiveram a responsabilidade de esperar o noivo prontas (o que conota que devemos estar prontos para quando o Noivo - Jesus, voltar), mas somente a metade delas cuidaram de sua responsabilidade de deixar suas lâmpadas acessas e ter o óleo suficiente para quando o Noivo chegasse, já as outras, se distrairam e por isso, não foram eleitas.

As Escrituras, em todo seu conteúdo, mostram que Deus delegou responsabilidades ao homem. Deus poderia, em Sua eterna soberania, fazer tudo sem precisar do ser humano, mas Ele escolhe nos dar responsabilidades, pois dessa forma teremos frutos. Reflita: Deus escolheu Abraão para peregrinar e dele vir uma grande nação da qual nasceria nosso Redentor. Por que Deus precisaria de Abraão para fazer cumprir seus planos? Mas Deus escolheu delegar a um homem. Deus resolveu libertar seu povo do Egito. Deus poderia fazer isso milagrosamente, mas escolheu Moisés para liderar, novamente Deus escolheu um homem para ter essa responsabilidade enquanto Ele mesmo poderia fazer. Deus escolheu uma mulher para dar à luz a Seu Filho Jesus. Deus poderia tê-lo feito como fez Adão, nascido da Terra, mas não o fez. Mais uma vez, o ser humano tem responsabilidades divinamente dadas sobre si. Apesar da lista ser muito grande, vou finalizar com um último argumento que é a pregação do Evangelho, pois Deus poderia simplesmente fazer Seus "eleitos" crerem e não enviar ninguém para uma tarefa extraordinariamente grande, mas escolheu delegá-la para os homens.

Eu poderia citar muitas outras responsabilidades citadas nas Escrituras, mas, acredito que já é possível entender. Então, pense comigo: Se o fato de Deus delegar ao homem autoridade para responsabilidades específicas é uma "diminuição" de Sua soberania, então a Bíblia inteira está errada, pois vemos essa atitude de Deus de forma muito recorrente em toda Escritura.

Independente da condição do ser humano, Deus lhe deu responsabilidades sobre sua própria vida e a maior responsabilidade outorgada por Deus para o ser humano, foi de escolher o caminho que deveria seguir o qual não vemos em lugar nenhum nas Escrituras que Deus nos negou isso, mas vemos o oposto, quando lemos sobre a parábolda da porta estreita (Mt 7:13-14). Por isso, homens que se arrependem como aconteceu com os ninivitas também têm chance de receber a salvação.

Crer na predestinação não faz muito sentido quando vemos casos como o da cidade de Nínive e dos romanos (lembrando de Atos 10), pois seria muito controverso Deus mandar anunciar "vou destruir Nínive" e depois, por seu arrependimento, Deus voltar atrás. Segundo outra parte da teologia calvinista, a questão da presciência, à qual também creio, só que para casos como estes, a presciência é outro fator que compromete a doutrina da predestinação, porque se Deus já tinha conhecimento do arrependimento de Nínive, por que ele iria mandar destruí-la? Sim, Deus já conhecia o que iria acontecer com Nínive e talvez foi por isso que mandou Jonas anunciar sua destruição, mas devemos considerar que Deus queria que o povo se arrependesse e que o anúncio de sua destruição foi o gatilho que trouxe o povo ao arrependimento. Parece inclusive que Jonas também já tinha conhecimento disso, por isso decidiu fugir, porque para ele era inaceitável que Nínive fosse perdoada. Se você consegue compreender esse conteúdo, provavelmente vai entender que se há uma predestinação, então seria como se Deus tivesse brincado com Nínive, assustando-os. Isso sim é inconcebível.

Em respeito aos nossos irmãos calvinistas, de maneira alguma faço qualquer discriminação aos irmãos, somente uma divergência de pensamentos baseados nos meus conhecimentos teológicos adquiridos sob pesquisas bíblicas e históricas. Assim como fundamentei meu argumento nas Escrituras, tenho plena ciência de que todo conhecimento da doutrina calvinista também procede das Escrituras, só temos visões diferentes. O fator mais importante que Arminianistas e Calvinistas concordam é que só existe um Deus e que somente por Seu Filho Jesus - o Messias, é que podemos ser salvos e que não há nada em nós que nos faça merecedores da salvação, mas o sangue de Jesus nos purifica de todo pecado.

Conclusão

Jonas não aceitou a conversão e o perdão de Nínive. Vemos que o livro de Jonas termina com uma exortação que Deus faz para o profeta e não com seu arrependimento. Com Pedro, foi diferente, pois ele teve um sentimento bem parecido de indiferença (no caso com os gentios), mas, quando Deus fala com Pedro, este não negligencia Sua voz, atende ao chamado de Deus e ainda explica ao povo que todos podem receber o perdão de Deus, inclusive nós, gentios.

Devemos seguir o exemplo de Pedro e não de Jonas no tocante à aceitação do conceito de que qualquer pessoa que se achegar a Deus com arrependimento sincero será perdoada, independente de quem era e do que já fez. Em muitos casos, isso é realmente difícil de conceber, como aconteceu com Jonas, mas precisamos nos lembrar de que Deus é compassivo e tardio em se irar.

Nós podemos ter pecados diferentes de muitas pessoas, mas devemos lembrar que ainda somos pecadores e completamente dependentes da Graça de Deus. Não há obra alguma, ou benfeitoria alguma que possa nos dar mérito para "pagarmos" nossos pecados, mas sempre dependeremos da Graça e misericórdia de Deus para alcançá-Lo. E olhando dessa forma, vamos entender que todos aqueles que se arrependerem também poderão recebê-la, por isso, sempre devemos olhar a todos com o olhar de Cristo, ou seja, com o seguinte pensamento: "A todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, os que creem em Seu Nome". (João 1:12)

08 de março de 2024
Por Rogério Filho

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