Quem eram os Samaritanos?

Quem eram os Samaritanos?

A Cidade de Samaria — Da Glória à Rejeição

Antes da divisão dos reinos, a região de Samaria fazia parte do território unificado de Israel. Após a morte de Salomão, com a cisão entre o Reino do Norte (Israel) e o Reino do Sul (Judá), Samaria passou a ter um papel central: tornou-se a capital do Reino do Norte, especialmente a partir do reinado de Onri, conforme registrado em 1 Reis 16:24. Localizada estrategicamente nas montanhas de Efraim, Samaria floresceu politicamente, mas espiritualmente afundou em idolatria, alianças pagãs e rebeliões contra o Senhor.

Séculos depois, a cidade foi conquistada pelos assírios, e muitos israelitas foram levados ao exílio. Em seu lugar, povos estrangeiros foram introduzidos, o que deu origem a uma mistura cultural e religiosa — os samaritanos. Essa miscigenação fez com que os judeus, mais tarde, considerassem os samaritanos como impuros, indignos da aliança de Deus.

Hoje, as ruínas da antiga Samaria estão localizadas perto da aldeia moderna de Sebastia, na Cisjordânia, próxima a Nablus (a antiga Siquém). As ruínas incluem colunas romanas, uma acrópole, vestígios de um palácio e até uma igreja bizantina, testemunhando os muitos períodos históricos vividos ali.

Essa antiga capital do Reino do Norte tornou-se, ao longo dos séculos, símbolo da divisão entre irmãos — uma ferida profunda no coração da Casa de Israel. Mas será que esse cisma é eterno? O que dizem as profecias sobre a união de Israel e Judá?

A Divisão de Israel

Para entender a origem dos samaritanos, é necessário compreender o processo geopolítico de Israel. Começamos com a morte de Salomão e a ascensão de seu filho, Roboão, em 931 a.C.

Salomão tomou muitas mulheres estrangeiras como esposas e, para satisfazer as ostentações delas, ergueu templos a deuses estranhos. A Bíblia relata que “além da filha de Faraó, [Salomão] amou muitas mulheres estrangeiras: moabitas, amonitas, edomitas, sidônias e heteias” (1 Reis 11:1), o que contrariava diretamente a ordem do Senhor de que não se casassem com mulheres de nações estrangeiras para que não se desviassem para outros deuses (1 Reis 11:2). De fato, o texto diz: “Quando Salomão já era velho, suas mulheres lhe perverteram o coração para seguir outros deuses; e o seu coração não era perfeito para com o Senhor, seu Deus” (1 Reis 11:4). Como consequência, ele ergueu altares a deuses pagãos como Astarote e Moloque (1 Reis 11:5–8). Isso resultou em altos custos de mão de obra e materiais, trazendo instabilidade econômica para Israel. A solução encontrada foi aumentar os impostos do povo, gerando grande insatisfação.

Após a morte de Salomão, seu filho Roboão subiu ao trono. O povo de Israel, reunido em Siquém, esperava que o novo rei aliviasse a carga tributária imposta por seu pai. Eles disseram: “Teu pai tornou pesado o nosso jugo; alivia agora a dura servidão de teu pai e o pesado jugo que nos impôs, e nós te serviremos” (1 Reis 12:4). No entanto, imprudentemente, Roboão ignorou os conselhos dos anciãos, que o orientaram a atender o pedido do povo, e seguiu o conselho de jovens que cresceram com ele, os quais recomendaram: “Dize ao povo: Meu dedo mínimo é mais grosso do que a cintura de meu pai. Pois se meu pai vos impôs um jugo pesado, eu o tornarei ainda mais pesado” (1 Reis 12:10–11). Essa postura arrogante causou grande desgosto entre os israelitas e desencadeou a divisão do reino.

Ainda durante o reinado de Salomão, surgiu um opositor: Jeroboão, filho de Nebate, da tribo de Efraim. Era um homem valente e competente, a quem Salomão confiou a supervisão dos trabalhos forçados da casa de José (1 Reis 11:26–28). No entanto, Deus enviou o profeta Aías, o silonita, para anunciar a Jeroboão que ele receberia o governo de dez tribos de Israel, como juízo pela idolatria de Salomão: “E eis que rasgarei o reino da mão de Salomão e a ti darei dez tribos” (1 Reis 11:31). Temendo a influência de Jeroboão, Salomão procurou matá-lo, e ele fugiu para o Egito, onde permaneceu até a morte do rei (1 Reis 11:40).

Após a morte de Salomão, Jeroboão retornou a Israel. Quando Roboão rejeitou o pedido do povo por alívio fiscal, as dez tribos se rebelaram e fizeram de Jeroboão seu rei (1 Reis 12:20). Apenas as tribos de Judá e Benjamim permaneceram fiéis à casa de Davi. A tribo de Levi, que não possuía território próprio, teve parte de seus membros distribuídos entre ambos os reinos, mas muitos permaneceram em Judá por causa da fidelidade ao culto no Templo (2 Crônicas 11:13–17). Assim, o reino se dividiu: o Reino do Norte passou a ser chamado de Israel, e o Reino do Sul, de Judá.

Ao assumir o trono do Reino do Norte, Jeroboão temia que o povo, ao querer adorar a Deus, fosse ao Templo em Jerusalém (no Reino do Sul) e, com isso, ele perdesse o controle do reino. Então, “aconselhou-se o rei, e fez dois bezerros de ouro” (1 Reis 12:28). Um foi colocado em Betel e o outro em Dã, e Jeroboão disse ao povo: “Muito trabalho vos será subir a Jerusalém; vês aqui teus deuses, ó Israel, que te fizeram subir da terra do Egito.” (1 Reis 12:28). Assim, ele desviou o povo da adoração verdadeira e instituiu a idolatria no Reino do Norte (1 Reis 12:30), rompendo definitivamente com o culto estabelecido por Deus.

Essa atitude atraiu a ira de Deus, pois violava o mandamento de não construir imagens para adoração. Deus levantou profetas como Elias, Eliseu, Oséias e Amós para repreender o povo e exortá-los ao arrependimento, mas eles continuaram a adorar deuses estranhos como Moloque, Baal e Asherah.

As profecias eram claras: o povo seria destruído por causa da idolatria. Em 745 a.C., Tiglate-Pileser III subiu ao trono da Assíria, transformando-a em uma potência militar no Oriente Médio. Após ele, Salmaneser V iniciou uma campanha contra Israel, mas morreu antes de concluí-la. Sargão II assumiu o trono e, em 722 a.C., completou a conquista de Israel.

A origem dos Samaritanos

A Assíria utilizava uma política de miscigenação forçada com os povos conquistados. Ao tomar a cidade de Samaria, capital do Reino do Norte, deportou boa parte da população israelita e trouxe povos de outras nações para habitar a região (2 Reis 17:24). Esse processo resultou em um amálgama étnico e cultural. Os israelitas remanescentes, que já estavam fortemente inclinados à idolatria, passaram a conviver com esses povos estrangeiros, o que acelerou o sincretismo religioso.

O novo povo formado em Samaria passou a cultuar o Deus de Israel, mas misturando essa fé com práticas pagãs. Assim surgiu o grupo dos samaritanos: uma população mista, tanto em sua origem quanto em sua religião, fruto da união entre israelitas, assírios e outros povos, influenciados por diversas crenças.

As dez tribos de Israel foram espalhadas e perderam sua identidade nacional. No entanto, alguns remanescentes, como os samaritanos, preservaram certos costumes e tradições, afirmando descender principalmente das tribos de Efraim e Manassés. Mais tarde, os samaritanos construíram um templo rival no Monte Gerizim, afirmando que ali era o verdadeiro local de adoração. Isso intensificou ainda mais o conflito com os judeus do Reino do Sul, que consideravam Jerusalém o único lugar legítimo para o culto.

A Rixa entre Judeus e Samaritanos

Com a mistura do povo israelita com outros povos, os judeus (do Reino do Sul) já não reconheciam os samaritanos como descendentes legítimos de Abraão, considerando-os idólatras e impuros por se contaminarem com práticas proibidas pela Lei de Moisés.

O Reino do Sul também se corrompeu espiritualmente, resultando no cativeiro babilônico. No entanto, ao contrário dos israelitas, os judeus não foram misturados com outros povos e puderam manter suas práticas judaicas, embora sob muitas restrições, incluindo a perda do Templo. Após o cumprimento da profecia de Jeremias, Ciro, rei da Pérsia, libertou o povo, que retornou a Judá. Eles passaram a valorizar os mandamentos, abandonaram a idolatria e construíram sinagogas, que se tornaram lugares de ensino da Torah.

Com tais práticas, os judeus desenvolveram um preconceito contra os samaritanos, considerando-os hereges por sua idolatria e corrupção espiritual. Esse preconceito gerou uma rixa entre judeus e samaritanos, levando ambos os grupos a se odiarem e evitarem contato entre si. Atualmente, há um pouco mais de 800 samaritanos no mundo e a rixa entre Judeus e Samaritanos já não existe. As Escrituras nos revelam que Deus tem promessa de reunificação de toda Casa de Israel.

A Reunião das Casas de Israel e Judá – Promessa Irrevogável

Biblicamente, há uma promessa de reunificação de Israel como um só corpo. Algumas linhas teológicas insistem em afirmar que as promessas de Deus para Israel já não existem mais, porém as Escrituras afirmam o contrário. O que Deus prometeu a Abraão não seria anulado pela perda temporária das dez tribos. Vemos na Bíblia várias citações sobre a restauração futura de todo o Israel étnico, sem a divisão em dois reinos.

🪔 Ezequiel 37:15–22 – Duas varas, um só povo

"Filho do homem, toma um pedaço de madeira e escreve nele: Para Judá e os filhos de Israel, seus companheiros. Depois toma outro pedaço de madeira e escreve nele: Para José, vara de Efraim, e toda a casa de Israel, seus companheiros. Junta um ao outro, para que se unam, e se tornem uma só vara na tua mão." (Ez 37:16–17)

Ezequiel profetiza a união de Judá (o Sul) com as dez tribos (Norte, Efraim). Isso é dito explicitamente como uma promessa futura, em que Deus mesmo declara: “Farei deles uma só nação na terra...” (Ez 37:22)

🌿 Jeremias 31:31–33 – Nova aliança com as duas casas

"Eis que dias vêm, diz o Senhor, em que farei uma nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá..." (Jr 31:31)

Essa nova aliança é frequentemente aplicada ao evangelho (e corretamente), mas veja que o destinatário é duplo: Israel + Judá. A promessa é que a Lei será escrita no coração e Deus será o seu Deus — não só de Judá, mas da Casa de Israel. A nova aliança não substitui Israel, mas restaura a fidelidade e reúne os dispersos.

🌍 Isaías 11:12–13 – Reunirá os dispersos de Israel

"Levantará um estandarte para as nações, ajuntará os desterrados de Israel, e os dispersos de Judá congregará desde os quatro cantos da terra."

"E desaparecerá a inveja de Efraim, e os adversários de Judá serão destruídos; Efraim não invejará Judá, e Judá não hostilizará Efraim."

Isaías deixa claro que a divisão entre Efraim (Norte) e Judá (Sul) será curada, algo que, embora tenha tido um cumprimento parcial em eventos históricos, ainda aguarda sua total realização no futuro, quando Deus reunirá todos os dispersos de Israel.

✝️ Jesus e os apóstolos também falam disso

Jesus disse: "Tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também a estas me importa conduzir, e elas ouvirão a minha voz; e haverá um rebanho e um pastor." (Jo 10:16)

Muitos estudiosos veem aqui uma alusão tanto aos gentios quanto aos judeus dispersos, especialmente os das dez tribos. Tiago, irmão do Senhor, escreve: "Tiago, servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo, às doze tribos que andam dispersas, saúde." (Tg 1:1). Isso mostra que a esperança das doze tribos ainda estava viva no cristianismo apostólico.

Uma reflexão final

Ainda que esta reflexão não esteja diretamente ligada à situação dos samaritanos, ela me fez pensar em como muitos de nós enxergamos pessoas de outras religiões.

Os judeus rejeitavam os samaritanos por serem um povo de cultura e fé mistas, acreditando que, por isso, não eram dignos da misericórdia de Deus. Jesus, no entanto, usou esse preconceito para revelar o oposto: mostrar que aqueles que “estão de fora” também podem alcançar a promessa de serem recebidos como filhos de Deus, por meio da graça divina.

Sendo assim, por que devemos julgar aqueles que ainda não conhecem a Cristo? O caráter e a fé de alguém não estão necessariamente ligados ao ambiente em que vive. Na Bíblia, por exemplo, o episódio da mulher samaritana e a parábola do bom samaritano mostram como Jesus reconheceu que os samaritanos também faziam parte da promessa feita à “Casa de Israel” — ou seja, às doze tribos. Isso nos ensina que Deus vê o coração das pessoas, e que sua graça está disponível a todos, não importa de onde venham ou em que circunstâncias vivam. O que importa é que deixem seus pecados, vivam conforme as Escrituras e recebam o Messias — Jesus Cristo.

E nós, como gentios — lembrando as palavras do apóstolo Paulo — fomos enxertados na oliveira, que é Israel (Rm 11). Portanto, podemos entender que há muitas pessoas que ainda não estão em nosso meio, mas que também poderão receber essa promessa. E é justamente por isso que temos o dever de levar o evangelho a todos.

Que a antiga rixa entre judeus e samaritanos nos dias de Jesus não se torne um símbolo das nossas próprias atitudes. Compreender que Jesus veio para unir e reconciliar é essencial para que o evangelho seja verdadeiramente proclamado.

Que nossas vidas sejam, portanto, uma pregação constante àqueles que convivem conosco. Pregue sempre — com suas palavras, com seus exemplos, com sua vida.

Por Rogério Filho
05 de maio de 2025

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